No início dos anos 90, no centro de Cuiabá, calçadas, ruas e praças eram tomadas pelo comércio informal causando insegurança aos pedestres e insatisfação aos comerciantes formais pela concorrência, considerada desleal.
Para solucionar, a prefeitura promoveu reuniões com as associações dos camelôs, dos comerciantes e dos empresários, vereadores e secretarias municipais afins e o órgão de planejamento municipal, IPDU, designado para elaborar um plano para o comércio informal, do qual participei como técnica. Com o nome de “Plano Setorial de Comércio Alternativo”, foi elaborado após pesquisa e cadastramento dos camelôs pela Secretaria de Bem Estar Social, que fez a seleção dos contemplados.
Para os que já atuavam em barracas, foi proposta a realocação para área pública, ao lado do Parque de Exposições e a construção de edificação com piso, cobertura, sanitários, administração e pequeno estacionamento. As associações dos comerciantes e dos empresários formais colaboraram com a construção da estrutura e a Prefeitura em alguns serviços. Os contemplados não pagaram pela estrutura, porém deveria haver controle dos pontos para que não ocorressem a venda. O comerciante que não “coubesse” mais na sua banca entregaria o ponto a ser repassado a outro necessitado, sob controle municipal. O controle nunca aconteceu.
A princípio os camelôs rejeitaram o local, mesmo assim foram transferidos com a promessa de a Prefeitura manter ônibus gratuito até que a população se acostumasse com o novo ponto. Em pouco tempo o estacionamento para clientes ficou pequeno, não recebiam apenas os usuários do transporte coletivo, como imaginavam. Para esses a situação estava resolvida.
Também pensamos na possibilidade de novos pequenos comerciantes se instalarem nos mesmos moldes, a custos próprios, em locais já edificados, porém a legislação vigente era omissa. Então foi elaborado o Decreto n. 3.118 de agosto de 1995 que “Regulamenta a construção e instalação de galerias populares”, com parâmetros próprios, visava em especial a segurança pública, das instalações e dos comerciantes.
Pelo decreto, galerias populares eram “o conjunto de, no máximo 100 (cem), unidades autônomas, instaladas em terrenos ou edificações destinadas ao comércio varejista de mercadorias de pequeno porte ou à prestação de serviços.” Locais com mais lojas estariam classificados em outra categoria, talvez shopping center, porém, para esses a legislação é muito mais exigente quanto à segurança e aos impactos provocados pelo empreendimento à vizinhança. Para a transformação do chamado Camelódromo em Shopping Popular parece que as normas foram esquecidas.
Quando foram assentados, o espaço era aberto, os equipamentos e materiais comercializados eram de outro tipo. Depois veio o fechamento das laterais, as divisórias, o forro, as fiações elétricas, o segundo piso, a praça de alimentação e parece que nesse afã de ampliar foram esquecidas as normas construtivas, inclusive no que tange à prevenção de incêndio, tanto pelo poder público quanto pela administração do shopping popular. Pelas imagens vê-se que a estrutura derreteu.
Felizmente não havia público e nem lojistas. Poderia ter ocorrido uma tragédia maior se estivesse em horário de funcionamento. Lembrei-me do incêndio da Boate Kiss, no RS, em 2013 onde houve centenas de mortes. Espero que o desastre tenha servido para o aprendizado e que na reconstrução esses ensinamentos sejam utilizados. Não quero nem imaginar se o incêndio tivesse acontecido após a ampliação dos oito pavimentos previstos, sete destinados a vagas de estacionamento e ainda salas de cinema.