Regras, normas, burocracia são um conjunto de princípios destinados a manter determinadas atividades dentro de padrões de controle. O controle interessa a manutenção do poder, e este está diretamente relacionado à personalidade, tendo como origem o medo. O medo gera a necessidade de controlar e o que é controlado não se desenvolve, uma vez que todo progresso está relacionado ao movimento.
As dificuldades ao progresso devem ser consideradas no aspecto coletivo e individual. No primeiro caso elas são amplamente estudadas e a dificuldade de sua remoção ou mesmo racionalização são conhecidas como resistência à mudança. Como essa é necessária e inevitável temos nos tempos atuais pessoas e organizações envelhecidas causando prejuízos e desperdícios.
Como as organizações são compostas de indivíduos, vamos primeiro ver como os sistemas de crenças interiorizados dificultam o desenvolvimento. Partiremos do princípio que tudo que é criado parte sempre de uma transgressão ao que está estabelecido, seja qualquer trabalho, uma obra de arte e principalmente uma descoberta inventiva qualquer. Quando você age e se entrega à incerteza renunciando ao desfecho das situações, a vida se torna uma grande aventura, uma experiência em que a mente condicionada será desconstruída. Nessa aventura não há garantias, tudo pode acontecer. Quando permitimos viver essa aventura, abrimos o campo da potencialidade pura.
Como escreve Deepak Chopra, médico e filósofo indiano radicado nos EUA: “Quanto mais você acessa a sua verdadeira natureza, mais espontaneamente aparecem os pensamentos criativos, porque o campo da potencialidade pura também é o campo da criatividade infinita e do conhecimento puro. Franz Kafka, filósofo e poeta austríaco disse certa vez: “Você não precisa sair de seu quarto. Fique sentado diante da mesa e ouça. Não precisa nem ouvir, simplesmente espere. Não precisa nem esperar, aprenda somente a ficar quieto, silencioso, solitário. O mundo se oferecerá espontaneamente a você para ser descoberto. Ele não tem outra escolha senão jogar-se em êxtase a seus pés.”
Esse texto nos pode nos parecer fantasioso demais para ser verdade, isso tomado sob a ótica da personalidade que julga e classifica tudo segundo seu sistema de crenças, totalmente baseado no medo. O Ego ou personalidade se expressam pela vontade que nos permite colocar foco em algo, seja interno ou externo. Suas percepções da realidade, tanto de si mesmo quanto dos outros, estão muito influenciadas pelo que queremos, por nossos desejos, os quais estão sempre relacionados ao medo e às necessidades, então, sempre, por trás de nossas vontades existe sempre um sentimento de falta ou necessidade.
Pela faculdade da vontade o ego pressiona a realidade que tem que ser forçada para o que ele quer que acreditemos, pois trabalha a partir de um conjunto de percepções básicas, segundo as quais a realidade funciona. Precisa colocar julgamento em tudo que vê e observa. Não há lugar para simples observação das coisas. Tudo precisa ser dividido em categorias, precisa ser rotulado de certo ou errado.
James Hillman, em seu livro “O Livro do Puer”, página 30, descreve com exatidão o programa prepotente do ego” “Paradoxalmente estamos menos conscientes quando estamos mais conscientes. Quando estamos em plena eficiência egóica, certos de nós mesmos, sentindo-nos muito seguros, movimentando-nos dentro daquilo que mais conhecemos, estamos o menos reflexivamente cônscios. Muito perto da luz é aonde menos enxergamos. Nossa destrutividade é realmente sentida no que há de mais próximo e é o resultado que se forma à partir do próprio centro egóico de nossa luz... pois a egocentricidade pode dizer “eu sei” – pois ele de fato sabe, e esse conhecimento é poder. É também frio e seco.
Essa natureza do ego é que impede tanto as reflexões como o entendimento entre as pessoas, principalmente quando estão em discussão aspectos ideológicos, os quais representam, em muitos casos, a identidade da pessoa. Assim sendo, ela não pode abrir mão de seus ídolos, por eles mata e morre.
Consideremos agora as instituições que são compostas por indivíduos, cada qual com seu sistema de crenças. Havendo, pois, um propósito na organização, nada mais claro que a necessidade de estabelecer um conjunto de regras que unifique a ação de seus componentes, visando a obtenção das metas estabelecidas. Acontece, porém, que vivemos tempos de transformações profundas e vertiginosas, que nos obrigam a adaptações constantes para nos atualizarmos e fazermos parte de uma nova realidade. As palavras mais faldas hoje em dia são criatividade e inovação. Por causa delas, ideias se sobrepõem a histórias e patrimônios centenários, alguns deles foram engolidos pelas mudanças que não foram capazes de compreender e implementar.
A conhecida história da criação da Microsoft e outras hoje poderosas organizações são provas vivas desse fenômeno de mudanças. Consta entre tantas outras questões que a Microsoft procurou pessoas jovens oferecendo-lhes desafios e um ambiente totalmente desprovido de regras, seja de cumprimento de horário, hierarquia, vestuário, etc. Refletindo sobre o enorme e vertiginoso sucesso dessas organizações encontramos a ausência de controle, uma vez que ele é totalmente prejudicial à criação. Talvez o exemplo mais marcante de como as regras dificultam o desenvolvimento se encontra na interferência do estado sobre as pessoas e as instituições. Principalmente no que se refere à burocracia do sistema tributário, suas normas complicadas e que mudam com muita frequência, criam uma parafernália que se traduz em muito prejuízo de recursos. Esse conjunto de normas que visa o controle e arrecadação é tão resistente porque se apoia numa cultura onde pessoas e organizações se tornam vítimas e também cúmplices dos processos enrolados, uma vez que as “autoridades” que os criam e os impõem são constituídas pelo próprio cidadão.
Sempre temos a impressão de que a gestão empresarial é uma atividade desenvolvida de maneira fácil, mas o bom gestor, com olhar crítico e inovador, deve compreender que a burocratização, o excesso de normas atrapalha o desenvolvimento de estratégias, pois transforma as pessoas em tecnocratas controlados por regras, embarga o andamento dos processos, abafa o dinamismo da organização dificultando sua relação com o mercado. Presos a ideias engessadas, não apenas os gestores como também os colaboradores impedem a circulação de novos métodos e processos que podem ser amplamente benéficos.
O conjunto de normas e burocracias cria dificuldades que são transtornos estudados como sendo disfunção burocrática. Eles geram problemas como a desmotivação criada por execução de tarefas repetitivas, seja pela necessidade de digitação de uma porção de senhas para ter acesso a informações necessárias à execução dos trabalhos, ou a exigência de preenchimento de formulários controladores que exprimem o excesso de zelo com a segurança. Outros fatores criados a partir de excesso de norma e burocracia são custo dos controles em função de, às vezes, riscos baixos; perda de competitividade; falta de incentivo à inovação e, em muitos casos, necessidade de recursos logísticos exagerados.